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um amor atrevido

um amor atrevido

Março 20, 2006

a streetcar named desire

Vieira do Mar

E, de repente, o teu cheiro que me chega. Perscruto as palmas das mãos, que acabei de lavar numa casa-de-banho pública, será do sabonete?, não é. Farejo as mangas do casaco, as abas, a gola, tê-lo-ei usado da última vez que estivemos juntos?, não, não usei. Rodopio-me na direcção das costas dos outros que se afastam, indiferentes à minha comoção, alguém que usa o teu perfume?, não, persistes por aqui, rodeias-me as raízes dos cabelos, os pêlos. Por momentos, até o sinal passar a verde, aquele velho cuspir no chão e a mulher de azul tropeçar no salto, passeias-te comigo - um boxeur fantasma que, a investidas de plasma, me esmurra o coração até se desvanecer nos odores do monóxido e da fast food, nos olhares ausentes que me trespassam o umbigo.

Março 19, 2006

some came running

Vieira do Mar

O abalroamento dos anos que passam traz-me a urgência de absorver a sorvos largos a vida que me resta e que, ao longe, parece sempre pequena, pouca e curta. Aqui me devolvo o atrevimento do Amor e me desvelo na hesitação da escrita: uma escrita em que o traço permanece tremido e as palavras, teimosas, insistem em soar-me a coisa diferente.

 

 

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