Abril 22, 2009
como agua para chocolate
Vieira do Mar
Não me apetece escrever, de tanto que o meu corpo te exige, com propósitos feudais. Que se lixe o romance e a poesia, só quero que me estafes e que rompas o teu silêncio estraçalhando-me os tabus, para depois poder adornar o meu cansaço nas tuas costas e que fiquemos assim, comprometidos com o momento e confinados a um espaço emprestado, os ruídos dos outros a circularem nas paredes como veneno. Não quero partilhar com ninguém os teus cabelos curtos por entre os meus dedos, a barba indolente que roças nos meus recantos cavos, nem o desenho da tua boca a sugar-me o antebraço. Não quero que saibam desta alquimia em que absorvo o teu cheiro através da minha pele, num processo simbiótico que podia fazer escola, nem destes desejos de cama e mesa, ilusões pequeno-burguesas de declarações conjuntas, passeios mão na mão e louças na máquina. Se pudesse, gastaria os meus dedos noutras práticas, como chegar ao teu epicentro atalhando-te pelo períneo, esfregando-me em ti como um bicho na casca de uma árvore e marcando-te meu território, enquanto o sol da tarde, insinuando que há vida lá fora, se atreveria a medo por entre as persianas estragadas.