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um amor atrevido

um amor atrevido

Setembro 13, 2010

the fisher king

Vieira do Mar

Preciso de saber de ti, mais do que preciso de ti. Não aguento, sabes?, não saber por onde andas, o que te move, a quem te dás e por onde te deixas. Imagino que por vezes te movas bambo, trémulo, por entre o desgosto e a bulimia, por entre o jacto e a euforia, mas nem disso tenho a certeza: suponho-te, quase tanto quanto te amo. No dias ímpares, duvido-te. Sei que por aí já se sente o degelo e que a Primavera amolece os corpos e tinge de turquesa o mar, embora pressinta que não repares nisso, ocupado que estás em amesquinhar as coisas. Dói-me o corpo e estranho-me, como se eu cravada em mim; és uma transfusão do tipo errado de sangue, ou do tipo de sangue certo mas a circular pelo avesso: entras-me por artérias e sais-me por veias, pirateando-me as intenções e deixando-me num desnorte de náufrago, porém centrífugo: em deixando, vou rapidamente ao fundo e a pique. Há um travo cómico-trágico na desmesura com que não estamos, uma dimensão teatral que polui a realidade e exacerba a distância (de continentes afinal, apesar de tão poucos, os quilómetros). Ardo por ora numa combustão sem propósito, investindo o ressaibo húmido contra as almofadas de penas, empurrando com raiva o lençol para os fundilhos da cama. Há um rancor que me rói a pele e me estraga os planos, a cada vez que me lembro do limbo sulfuroso em que te moves, da insegurança pantanosa onde às vezes te afundas, e de como num ápice fazes tábua rasa de tudo o que ficou para trás, ainda ontem eramos felizes. Dá-me medo de que não mudes nunca, de que um dia sejas só frases de guerra e de que, ao invés, me mudes a mim cada vez mais. Enquanto isso eu aqui, líquida desfeita, a gerir a saudade e o rancor em partes iguais, expectante e mal-resolvida. Não aguento, sabes?, não saber por onde andas, trémulo bambo, mendigo eufórico, trágico inseguro, destruidor de mundos.